Gols dentro e fora de campo
Padre Eustáquio teria orgulho em assistir as partidas do time criado em homenagem ao beato e ao bairro, mas, certamente, a maior felicidade do holandês seria ver os gols que os jogadores também assinalam fora da várzea.
O Padre Eustáquio Futebol Clube, que disputa a 3 divisão do campeonato amador de Belo Horizonte, promove eventos para arrecadar alimentos, brinquedos e vestuário a instituições carentes.
“Um de nossos trabalhos sociais é a partida solidária no fim de ano. Outro é a feijoada com samba. Tudo o que é arrecadado é entregue à creche e ao lar de idosos do bairro”, conta Paulo Augusto, de 29 anos. Ele é o fundador, o presidente e um dos meias da agremiação. “Tenho 46 gols no currículo”, diz o rapaz, sócio de um lava-jato na rua Francisco Bicalho, onde funciona a sede do clube.
Foi lá que surgiu a ideia de criar um clube em homenagem ao padre europeu, que viveu no bairro em 1943. Ideia na cabeça, Paulo reuniu amigos que o apoiaram no projeto. As cores do time foram inspiradas nas vestimentas do beato: “Padre Eustáquio usava batas preta, amarela e branca. Já o escudo foi surgindo aos poucos mesmo”. No lava-jato-sede do clube, uma foto do homenageado parece abençoar o time.
A agremiação também foi criada com a missão de resgatar o futebol amador no bairro. Nas décadas de 1960 e 1970, quarteirões que deram lugar a ruas como a Henrique Gorceix e a Costa Sena eram ocupados por campos de várzea. A região era um celeiro de craques e times: “Havia o Olaria, o Vasquinho, o Juventus… Foram vários, mas acabaram”, lamentou Paulo.
Atualmente, o bairro conta com apenas um campo. Fica no parque Maria do Socorro, no fundo do Aeroporto Carlos Prates, mas a estrutura do local não é apropriada para partidas. Os vestiários, por exemplo, foram alvos de vândalos: todos os mictórios foram quebrados. Ainda assim, o Padre Eustáquio Futebol Clube disputa algumas partidas no parque.
Mas o campo em que a agremiação mais manda seus jogos é o do Nacional, na Via-Expressa. Foi lá a estreia do clube: venceram o Castelo por dois tentos a um. “Por sermos um time amador e os jogadores terem trabalho, não treinamos. Nos encontramos horas antes das partidas”, explica Paulo. Reunidos, ouvem as palavras de Marcelo, que faz o papel de técnico e, claro, também é um dos meias do time.
A vida de jogador de várzea não é fácil. Manter o clube é um desafio que sai caro e, quase sempre, a despesa é bancada pelo próprio elenco. Mas essa é apenas uma das várias histórias que o grupo coleciona na várzea. Muitas, inclusive, são pitorescas. Quem conta é o próprio presidente-jogador: “Uma vez um cachorro invadiu o campo e furou a bola. Em outra, o juiz, que era policial, sacou um revólver para um torcedor que o ameaçou”.
Há histórias que poderiam ter um final feliz, como a do campeonato que disputaram em Santa Luzia, na Grande BH. O clube chegou invicto na final contra o tradicional Alvorada, que revelou o goleiro João Leite. Mas nada deu certo naquela partida. Um dos zagueiros machucou no início do jogo: derrota por 2 a 1. Mas Padre Eustáquio, o beato, certamente teria orgulho do xará, o time.